Artigo: O impacto da COVID-19 na captação do Terceiro Setor

Por Bianca Provedel

Com a pandemia do novo coronavírus (COVID-19), como o Terceiro Setor pode se reinventar? A pergunta é frequente entre empreendedores, lideranças, dirigentes e equipes de captação de entidades não governamentais. Mas, diante do atual cenário de instabilidade, como podemos buscar alternativas para reagir à atual conjuntura que atinge todos os setores da economia e encontrar soluções para arrecadar recursos e manter programas e projetos que atuam em prol de uma causa?

A primeira resposta para essa pergunta é foco no propósito. Há 21 anos, o Instituto Ronald McDonald aproxima famílias da cura do câncer infantojuvenil, que ainda é a doença que mais mata na faixa etária de 1 a 19 anos no Brasil, segundo o Instituto Nacional de Câncer, o Inca. Nossas crianças e adolescentes que possuem imunidade baixa estão no grupo de risco da COVID-19 e não podem parar o tratamento oncológico.  Por isso, diante do enorme desafio que vivenciamos, buscamos a cada dia reforçar o nosso propósito nas comunicações, no planejamento e junto ao time para gerar motivação para reconstruir um planejamento em andamento e que precisa diariamente de revisão, reflexão e correção de rotas.

Devido ao contexto mundial, tivemos que fazer uma grande revisão de estratégias e jogar todos os nossos esforços em novas alternativas, muitas delas sem termos chances nem de realizar a etapa piloto. Suspendemos a nossa grade de eventos presenciais de arrecadação prevista para o primeiro semestre de 2020. Além disso, temos diversas ações em parceria com empresas como o McDonald`s, que fechou seus restaurantes. Com isso, tivemos mais interrupções em nossas arrecadações, resultando em uma perda de mais de 40% das nossas receitas, um grande impacto na operação.

O Instituto tem um departamento que reúne as atividades de captação de recursos e comunicação. Entendemos que são áreas totalmente interligadas e uma oferece suporte à outra. Dentro desse contexto, segmentamos as atividades em três grandes unidades de negócio: Grandes Captações (que contempla parceria com PJ, novos modelos de eventos e Grandes Doadores), Pequenas Doações (com doações individuais, recorrentes, arredondamento, cofrinhos e outras ações ligadas às Pessoas Física) e Campanhas de Mobilização de Rede (em que se encontram as campanhas McDia Feliz, Sorte Acelerada, ente outras).

O IMPACTO!

Para continuar em nossa missão e buscar vencer esses desafios, criamos novas estratégias com ações de captação digital. Lançamos, em março, a campanha de financiamento coletivo “Vamos vencer juntos a COVID” em que convidamos a sociedade a apoiar as ações e contribuir com nossa causa. Fortalecemos a doação via aplicativo que também é uma iniciativa importante nesse momento de distanciamento social.

Outra estratégia que adotamos foi transformar a campanha Sorte Acelerada da modalidade, presencial, em mais uma ação digital via e-commerce. Essa ação é uma parceria com Hyundai Motor Brasil e consiste na modalidade de sorteio filantrópico, em que as pessoas podem adquirir cupons a R$ 10,00 e concorrer ao sorteio de um carro HB20 Nova Geração, que será realizado dia 09 de setembro pela Loteria Federal. Adquirir o cupom e concorrer ao prêmio é fácil, basta acessar www.sorteacelerada.org.br

Outra iniciativa que estamos trabalhando fortemente é arredondamento de compras via cartão de crédito em parceria com a Incentive, uma empresa que atua com diversas outras organizações. Nesta ação, a pessoa cadastra seu cartão Mastercard e toda compra realizada será automaticamente arredondada. Considerando que as compras estão sendo realizadas majoritariamente no formato online através de cartão de crédito, representa uma grande oportunidade de novas receitas. Temos que citar ainda a parceria com o Pic Pay, que permitiu inclusão do Instituto na “Central de Doações” por meio do aplicativo que possui diversas ações direcionadas à doação de pessoas físicas através das carteiras digitais e cashback.

Também estamos elaborando um plano de fortalecimento das relações institucionais por meio de ligações, e-mailmarketing e whatsapp. Isso gera um relacionamento mais próximo com parceiros e doadores, ainda que virtualmente, mostrando que o nosso trabalho não pode parar e que mais do que nunca precisamos de ajuda e de doações para manter nossas crianças e suas familiares seguros. Neste momento, toda contribuição é muito importante.

Estamos buscando realizar lives de entrevistas com personalidades e com cantores, que promovem o aumento da reputação das ações e das doações. Aliás, aproveito para convidar todos para acompanharem nossas redes sociais, com a programação dos próximos bate papos. Tivemos também um desafio incrível chamado “Na Esteira da Solidariedade”, realizado pelo ultramaratonista Mauro Chasilew, que correu 100 km em casa. Ele ficou 12h na esteira em prol da causa do câncer infantojuvenil.

E agora já começamos a pensar em como digitalizar a campanha do McDia Feliz, que será em novembro e, certamente, ganhará nova roupagem e virá com grandes desafios em 2020, ano em que completa 32 edições.

Diante desta instabilidade e desafios, esses são alguns exemplos de mudanças que implementamos para passar por esse desafio. Estamos diariamente renovando nosso portfólio e redesenhando o nosso planejamento. Afinal, conseguir recursos é um desafio muito grande para todas as instituições que atuam como alguma causa. E precisamos da sua ajuda para salvar a vida de crianças e adolescentes com câncer no país.

No entanto, acredito que tudo o que estamos vivendo trará uma nova visão para a cultura da doação e para o terceiro setor. Nesse momento temos vivenciado um grande paradoxo. Ao mesmo tempo em que pesquisas indicam que mais de 60% das instituições de terceiro setor no mundo apresentam queda de receitas em relação aos valores arrecadados anteriormente, estamos vendo uma grande mobilização da sociedade para ajudar algumas iniciativas, principalmente, apoio aos que estão em uma situação de vulnerabilidade extrema. Segundo pesquisa do Monitor das Doações da Associação Brasileira de Captadores de Recursos (ABCR), que começou a mapear as ações do setor privado no fim de março, o mundo corporativo e a sociedade civil estabeleceram alianças que mobilizaram mais de R$ 5 bilhões em doações para projetos de combate à Covid-19 e suas consequências.

Portanto, o primeiro semestre de 2020 tem sido encarado como um momento histórico na filantropia brasileira e tende a trazer o aumento do protagonismo para o terceiro setor e o estimulo à cultura de doação junto à sociedade brasileira. Acredito que mesmo que estejamos sentindo um forte impacto em nossas arrecadações, nos levando rapidamente a adaptar nosso modelo de atuação ao momento, buscar rápidas soluções e atuar com muita flexibilidade e resiliência, tenho certeza que sairemos muitos mais fortes e eficientes dessa crise, afinal, crise também é sinônimo de oportunidade.

Bianca Provedel é Coordenador da Área de mobilização de Recursos do Instituto Ronald McDonald